22 de agosto de 2012 | Informes especiales | Anti-neoliberalismo | Derechos humanos
Há dez anos um grupo de mães do bairro argentino Ituzaingó Anexo, na cidade de Córdoba, levantou sua voz e associou os inúmeros casos de câncer na zona com as fumigações de agrotóxicos que sofriam regularmente. O dia 21 de agosto de 2012 sua luta por saúde e dignidade: a justiça local condenou um produtor e um piloto por fumigar plantios de soja perto do bairro com o herbicida glifosato e o insecticida organoclorado endosulfan.
Os moradores, representantes do coletivo ambientalista Parem de Fumigar, vários profissionais, entre outros que se reuniram ontem em frente aos Tribunais da cidade de Córdoba, capital da província de igual nome, queriam cadeia para os produtores agropecuários Jorge Alberto Gabrielli e Francisco Parra, e o fumigador Edgardo Jorge Pancello.
Mas a Câmara do Crime de Córdoba impôs três anos de prisão condicional para Parra e Pancello, e absolveu Gabrielli. A sentença indica também que Parra tem que fazer trabalhos comunitários durante quatro anos e tem proibido usar produtos agroquímicos durante oito anos. Pancello também deverá fazer serviços comunitários e ficou inabilitado para aplicar produtos agroquímicos durante dez anos.
A ativista María Godoy, de Mães do Bairro Ituzaingó Anexo, considerou “terrível” o alcance da condena e disse que sentia “muita impotência”. “Nós queremos a cadeia para estes senhores porque nos envenenam e nos matam, porque nos estão jogando todos os dias venenos”, explicou a ativista.
Rádio Mundo Real teve acesso à vários áudios tomados após a leitura da sentença, disponíveis no site da União de Assembleias Cidadãs. Godoy destacou, apesar de seu incômodo pela “prisão condicional” imposta a Parra e Pancello, que a sentença “é um passo muito importante” porque existem muitas comunidades organizadas atingidas pelos agrotóxicos no país, que agora “podem lutar mais confiadas”. “Vamos estar junto a elas e mobilizando-nos, porque com o único que se consegue algo é com mobilização”, disse a ativista.
O julgamento havia começado no dia 11 de junho. Um dos denunciantes da causa foi o médico Medardo Avila Vázquez, ex-subsecretário de Saúde de Córdoba. Conforme o jornal argentino Página 12, Avila denunciou em 2008 aos produtores por considerar que fumigavam ao lado de Ituzaingó Anexo, apesar de a lei de agroquímicos proibir a aplicação aérea em um raio menor a 1.500 metros (no caso do endosulfan) e a 500 metros (no do glifosato) de distância da população urbana.
O fiscal Marcelo Novillo Corbalán havia pedido a pena de quatro anos de prisão efetiva para Parra, por considerá-lo co-autor do delito de contaminação ambiental por fumigações realizadas de outubro de 2003 a fevereiro de 2004, e instigador do mesmo delito por outra fumigação em 2008. Novillo exigiu também três anos de prisão efetiva para Pancello, por considerá-lo autor da contaminação ambiental constatada em 2008, quando fumigava um campo de Parra. A Fiscalía pediu a absolução de Gabrielli por falta de provas.
Avila, referente também da Rede de Médicos de Povos Fumigados, destacou logo da leitura do veredito que a justiça de Córdoba declarou que “é um delito” fumigar sobre as populações, “que não pode se continuar envenenando as pessoas para que alguns fiquem ricos”.
“É verdade que não houve uma condena exemplar para estes filhos da puta que sabiam que o bairro estava em emergência sanitária e continuaram aplicando venenos ali”, reconheceu. Mas reafirmou que agora se sabe em todo o país “que não pode se continuar fumigando sobre as populações e que a Justiça, os fiscais e a Polícia têm que vir com os moradores a deter os fumigadores e levá-los presos a partir do dia de hoje”. Avila acrescentou que “agora temos que ir pela Monsanto”, já que “não estamos dispostos a aceitar que seja instalada esta planta da empresa mais sinistra, mentirosa e corrupta que há no mundo”. Essa companhia estadunidense, que criou a soja transgênica RR plantada na Argentina e o glifosato ao que ela se resiste, tem projetado montar uma planta na localidade de Malvinas Argentinas, situada a poucos quilômetros de Ituzaingó Anexo.
Para Laura Gallo, integrante do coletivo Parem de Fumigar, no dia de ontem foi “emblemático”. “Finalmente hoje, depois de muito sofrimento, afirma-se que essa atividade com a que convivemos (as fumigações), e que se naturalizou e que nos vêm adoecendo, é um delito. Eu convido a todos a que pensem o que significa isso”, considerou. Para a ativista a sentença da terça-feira “é uma apertura à luta” para apoiar a cada povo fumigado do país, “para recuperar a dignidade de povo são”.
No início deste mês, o Movimento Nacional Camponês Indígena da Argentina, as organizações Grain e Amigos da Terra Argentina lançaram em Ituzaingó Anexo a “Campanha Nacional contra os agrotóxicos e pela vida”.
“Não vamos embora daqui com um sentimento de derrota, porque hoje vencemos. Vencemos quando conseguimos fazer com que fossem condenados e que esses caras ficassem sentados dois meses no banco dos réus”, expressou Gallo.
O advogado denunciante a pedido de Medardo Avila em 2008, Darío Avila, disse antes da sentença que a ideia era “por em debate um modelo de produção que é prejudicial para a saúde, dentro do que se conhece como a primeira causa por agroquímicos na América Latina, algo realmente histórico”. Conforme o jornal Página 12, o advogado contou que os últimos relevamentos sanitários realizados na população de Ituzaingó Anexo constataram que 33 porcento morre de câncer, sendo a principal causa de morte na zona. Em nível nacional, o câncer é a terceira causa de morte e abrange 18 porcento da população, indicou.
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