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8 de Dezembro de 2010 | Notícias | Justiça climática e energia | COP 16
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Os governos da Bolívia e Paraguai estiveram presentes nesta terça-feira na Assembleia Popular dos movimentos sociais em Cancun, perto do Hotel Moon Palace, onde são realizadas as negociações internacionais do clima.
Após estar na rodada de imprensa convocada pela Via Campesina no luxuoso resort da COP, um representante boliviano e seu homólogo paraguaio saíram para se encontrar com os movimentos.
Cerca de 5.000 pessoas participaram da marcha convocada também pela Via Campesina e ao final da marcha realizaram uma “assembleia dos povos”. Até ali chegaram o embaixador boliviano na ONU, Pablo Solón, e o assessor do presidente paraguaio Fernando Lugo sobre mudança climática, Miguel Lovera.
Pagar a dívida
Em entrevista com Rádio Mundo Real, o representante do Paraguai disse que seu objetivo na assembleia era transmitir aos movimentos sociais a segurança de que seu país defende “a mesma causa que a deles”. Manifestou que é necessário que seja feita “justiça” e que atinja um acordo em Cancún que signifique redução de emissões para os países desenvolvidos. Eles são os “criadores e principais responsáveis pela dívida climática”.
Lovera avaliou que até agora na COP tem havido “muito pouca negociação”. “Estamos passando a uma fórmula muito arriscada que deixa em mãos de poucos, as decisões mais importantes, que vão mudar a vida de muita gente. Acreditamos que essa não é a fórmula adequada, aqui estamos representantes legítimos de mais de 190 países que podem negociar e atingir acordos sensatos”.
O representante paraguaio destacou que são necessárias soluções “realistas” à mudança climática e não “as falsas soluções que só representam comércio e a possibilidade de ganhar dinheiro para algumas empresas e nações”.
Com o Acordo dos Povos na mão
Por sua vez, Pablo Solón foi uma das inúmeras pessoas que fizeram uso da palavra durante a Assembleia Popular. Em seu discurso garantiu que “a luta das ruas é a luta que é feita também dentro do Moon Palace”. “Até ali têm chegado as propostas de que devem ser reconhecidas os direitos da natureza se querem ser resolvidos efetivamente os problemas da mudança climática”.
Para o representante boliviano, a crise do clima é o resultado de uma relação de “desrespeito com nossa natureza, nossa Mãe Terra”, é consequência de que seja tratada “como se fosse uma coisa”. Em sua opinião, esta crise se resolve se é possível “voltar a ter uma relação de equilíbrio e harmonia com a natureza”, com uma visão que reconheça que “também ela tem direitos”.
“Assim como iniciou-se um processo para o reconhecimento dos direitos humanos há mais de 100 anos, nós estamos propondo o início de um processo para que sejam reconhecidos os direitos da natureza, da Mãe Terra, para mudar esta relação que o capitalismo nos tem imposto para com ela”.
Solón contou que na COP são promovidos novos mercados de carbono e que o governo da Bolívia os tem rejeitado enfaticamente, “seguindo as diretrizes de Cochabamba”, pela Cúpula dos Povos sobre Clima realizada ali em abril deste ano. O delegado da Bolívia explicou que os mercados de carbono têm permitido que os países industrializados comprem certificados de redução de emissões gerados no Sul global e assim evitar realizar suas reduções nacionais.
“Isto é inadmissível, porque através destes mecanismos de mercado, os países desenvolvidos nos passam a responsabilidade de reduzir para nós, os países em desenvolvimento”, disse Solón. “No fim das contas quem vai financiar quem?”, peguntou, e respondeu em seguida: “graças a estes mecanismos nós vamos financiá-los”.
Dentro do tema de mecanismos de mercado, Solón rejeitou especialmente o de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação das florestas nos países em desenvolvimento (REDD) e disse que esse assunto lhe “preocupa muitíssimo”. “Nunca antes havia sido proposto um desenvolvimento do capitalismo que ia a tomar funções da natureza para torná-las mercadorias e iniciar um processo de compra e venda dessas funções”, disse. “O que estão propondo através deste mecanismo REDD é valorizar quanto carbono captura uma floresta para, em função dessa quantidade, obter uns certificados de redução de emissões que são colocados a venda”, acrescentou.
Solón esclareceu que é claro que preciso um mecanismo de financiamento para “preservar” as florestas, “mas não para mercantilizá-los”. Disse que os países em desenvolvimento estão sendo muito pressionados para que se aprove REDD e que é um desafio evitar sua concretização nestas negociações.
O tema central na COP é o de redução de emissões, o que tem a ver com a aprovação ou não do segundo período de compromissos do Protocolo de Kioto (2013 - 2017). Os países do Norte, responsáveis por 75 porcento das emissões contaminantes na atmosfera conforme Solón, não assumem nenhum compromisso vinculante. O representante da Bolívia destacou que a temperatura média mundial aumentou 0,8 graus e que com essa pequena cifra há inúmeros desastres naturais. Alertou o grave que seria um aumento da temperatura mundial, como está previsto.
“O que querem fazer é não ter compromissos de cortes de emissões e continuar discutindo-os no ano que vem. Isto é inaceitável porque estão em jogo vidas humanas”, manifestou Solón. “A cada ano, produto da mudança climática e dos desastres naturais que provoca, morrem 300.000 pessoas. É um irresponsabilidade absoluta que digam em Cancún que não podem fazer compromissos de redução efetiva de seus gases de efeito estufa”, sentenciou.
Solón comentou que a proposta do Acordo dos Povos de Cochabamba da criação de um Tribunal Internacional de Justiça Climática, para julgar os principais atores da mudança climática, “é o que mais assusta aos países ricos”. “Quem nada tem, nada deve. Mas quem sabe que é responsável da perda de vidas humanas, da perda da natureza, obviamente não quer ser julgado e menos de uma sanção”.
Foto: Rádio Mundo Real
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